Divergente
autora do livro: Veronica Roth
roteiro baseado no livro: Evan Daugherty / Vanessa Taylor
ano de lançamento: março de 2014
direção: Neil Burger
elenco: Shailene Woodley / Theo James
Mais um simplório
filme para adolescentes interpretado por atrizes e atores não adolescentes. Nos
anos 40/50 os americanos tinham a cara de pau de colocar na pele de trintões
casadoiros uns camaradas que já haviam passado dos 40. Parece que o método
permanece o mesmo.
Depois veio a turma
da praia com cantores beach rock: romances de verão esquema Frank Avalon. Essa
modinha se precipita para os filmes de escola (High School) com meninas más e meninas
mais velhas pervertidas. Mas não se preocupe, você que tem pavor da palavra
modinha, pois modinha é tudo aquilo que, através de fórmulas, se perpetua no
mercado que deseja avidamente o seu dinheiro. Nada mais do que isso.
DIVERGENTE não escapa
da forma. Formatado está para lucrar.
Trata-se de adaptação para cinema. Veio do primeiro romance da trilogia
infanto-juvenil da escritora Veronica
Roth.
Mas, logo de cara tanto o livro como filme estimulam à
desobediência. Até acredito que deva ser assim – desobediente - pois ser obediente é baixar a cabeça, e isso é
chato, porém, lembremos, só será bom ‘desobedecedor’ aquela pessoa que for
Divergente. E, não são todos. São poucos e muito poucos os Divergentes.
Provavelmente não é o leitor, nem eu, por mais que nos identifiquemos com a
heroína Tris. E, da mesma forma que a
saga dos Vampiros propõe sangramentos somente por amor – mensagem subliminar
para não transar a torto e à direito, ou somente após casar - Tris não quer ir tão rápido assim e pede
clemência ao algoz, que é uma cópia de
James Franco só que um tanto mais alto.
O roteirista deste filme já havia escrito a
bobagem BRANCA DE NEVE E O CAÇADOR, portanto um sujeito apto para mais
uma adaptação que servisse ao gosto americano, ao gosto dos colonizados e ao
gosto da sessão da tarde.
Mas, nada daquilo, nem do livro nem do filme, soa a criação original. Em
Logan’s Run de 76 (romance de 67) já há
uma parede cúpula que separa a sociedade perfeita ou equilibrada de um
horizonte desconhecido - que no fim
descobrem ser um paraíso vegetal - após
a ultima guerra e há farta distribuição de amansadores de rebeldes. Logan é um
deles; na recente Game of Thrones (livros iniciado em 97) o paredão é a grande
muralha de gelo e do lado de lá há um mundo desconhecido habitado por gente
estranha; em Lost Horizon de 73 também a impossibilidade de se fugir de um
mundo distópico perfeito – controlado por seus chefes mais velhos, esses velhos
decrépitos... – impondo o poder sobre os jovens insurgentes como se todo jovem
fosse rebelde com alguma causa. Aqui tem uma cerca grande e vazada e lá, bem
longe, um mundo desconhecido que, provavelmente, e isso é fácil de adivinhar e
prever, será mostrado em um outro livro e em um outro filme.
Obra previsível. Nada se perde não assistindo o filme.
A Beatrice, por outro lado, é uma garota renascentista. Os Divergentes são renascentistas
humanistas. Explico: como Da Vinci, ela tem muitos talentos e isso é perigoso
para um mundo em que cada um deve escolher um talento só – uma única facção.
Vide a busca pelos vestibulares e suas carreiras. Vide o especialista que trabalha
em parafusos da porta esquerda. Para isso inventaram o conceito de vocação ou
dom recebido. Você teria aquele dom, aquela graça e acabou.
Na verdade, não! O ser humano é múltiplo, mas, foi formatado pela
sociedade que ele mesmo construiu. Pelas escolas. Pela família.
A morte dos pais passa batidão no roteiro por conta da dinâmica final –
tudo tem que caber em duas horas - e,
como se prevê, em vez de se virar sozinha como a Christine, sua amiga, por
exemplo, ela já está lá nos braços do herói
que chora pitangas por que apanhou de cinta do pai e nunca mais esqueceu
disso. Ora, ora, ora... É de ter muita peninha, mesmo.
Fiquei curioso com o grupo que corre de lá para cá aos gritos logo no
começo do filme. Muito bobo. Parecem fuzileiros defendendo a pátria ou grupo de
arrastão de praia. Coisa de criança mesmo. Sobem em prédio pelo lado de fora,
pulam de um lado para o outro, destroem o patrimônio, brincam de guerra dizendo
que é treinamento... e, ainda por cima, são policiais, pasmem – aqueles que
recebem ordens para “apaziguar” outros jovens que participassem de alguma
manifestação pela alta da passagem do trem, nas ruas, talvez. Os PMs são esses audazes. Na
verdade milicianos pagos pelo governo controlador. Pau mandado.
A corporação – Leviatã – é o vilão como sempre e é bom saber que os Leviatãs são construídos com o assentimento de todos os cidadãos para defender os interesses da totalidade das pessoas, mesmo que um ou outro se danasse no meio do caminho.
Para adentrar nesse mundo dos adultos tudo se fará através do uso de
drogas e estupefacientes que controlem o cidadão criativo – dinheiro, fama,
valorização, elogios, privilégio. Percebam que não há artistas nesse mundo. Os
tatuadores, por exemplo, que são artistas, são Divergentes. Para que serve um
artista? Não pode haver radicais e rebeldes que alterem o status quo.
Nesse caso todo gostei dos ‘Sem Facção’. Talvez aí estejam os artistas,
os que não encontraram seu caminho – há algum caminho? - e aqueles que não se enturmaram nas cotas
oferecidas pelo governo totalitário.
Se há uma lição a se tirar do filme, quiçá do livro, é que o jovem pode
ir mais além. Não se diminuindo, nem trabalhando para ninguém, nem fazendo
parte de patotas e gangs e tribos que estão sob controle de alguma mídia.
Aprenda a se perceber e saber quem é e isso não é de uma hora para outra. Seja uma Tris mas saiba que para ser Tris tem
que pagar um preço bem alto.
Permanece o Oráculo de Delfos: ‘temet nosce’, ou seja, ‘conhece-te a ti mesmo’.
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