Direção: Edgar Wright
Elenco: Ansel Elgort, Kevin Spacey, Lily James, Jon Bernthal, Eiza González, Jon Hamm e Jamie Foxx
Classificação:
Sinopse: Baby (Ansel Elgort) é um jovem
motorista prodígio que trabalha para um grande chefe criminoso (Kevin Spacey)
realizando fugas de assaltos em busca de sanar uma dívida antiga. Após conhecer
Debora (Lily James), uma jovem garçonete por quem se apaixona, ele deseja sair
dessa vida do crime, mas um último trabalho pode ameaçar seus planos.
Crítica
Há uma cena já icônica no filme
“Todo Mundo Quase Morto” (Shaun of the Dead) de 2004 dirigido por Edgar Wright,
na qual os personagens principais lutam contra um velho zumbi em um bar usando
tacos de sinuca enquanto “Don’t Stop Me Now” do Queen toca a todo volume em um
Jukebox. Este momento evidencia aquela que é das marcas registradas deste
diretor: a sincronia das ações dos personagens, da montagem e dos movimentos de
câmera com a trilha e os efeitos sonoros. Este novo trabalho de Edgar Wright,
Em Ritmo de Fuga, pode ser considerado uma obra inteira construída a partir deste
estilo, tendo em vista que praticamente todas as suas características técnicas
e narrativas giram em torno da música. O resultado não podia ser mais
divertido.
A presença da música já é desde o
começo justificada pelo roteiro. Baby sofreu um acidente quando era pequeno e
como consequência tornou-se vítima de um ruído constante em sua cabeça, ruído
este que ele só consegue suportar ouvindo música o tempo inteiro. A partir disso,
Wright já de cara utiliza essa justificativa para brincar com a presença da
música no filme, usando variação de volume, a direção do som e outros aspectos
do áudio para colocar o espectador no mesmo universo sonoro do protagonista. É
um trabalho de mixagem e edição de som sensacional. Além disso, a música esta
empregada em outras partes do roteiro e do arco dramático dos personagens,
permeando toda a história e se tornando parte integral da narrativa. Esta
coesão entre narrativa e trilha sonora acontece graças à excelente escolha das
músicas do filme, cada canção não só cria o clima perfeito para cada cena como
muitas vezes gera significados novos e camadas interessantes para o que vemos
na tela, além de serem extremamente cativantes e divertidas.
Tudo é musical no universo do filme |
O roteiro assinado pelo próprio
Edgar Wright é muito bem escrito, com uma sagacidade e dinâmica nos diálogos
que remete de cara aos filmes de Quentin Tarantino, Martin Scorcese e outros do
gênero. É um universo urbano criminal cheio de gírias, trocadilhos e ameaças
subjacentes, tudo capturado muito bem pelo tom dos diálogos. As referências
também são muito presentes, com menções diretas a diversos filmes clássicos, algumas
mais óbvias como uma pizzaria chamada “Goodfellas”, outras mais discretas como
um casaco verde usado pelo protagonista que remete diretamente ao Travis Bickle
de Taxi Driver (não à toa os dois são sujeitos fechados que encontram uma
válvula de escape no ato de dirigir).
O filme é tão referencial que até
mesmo o seu enredo parece uma homenagem à história do cinema. Não há nada de
novo ou original aqui e o filme parece totalmente consciente disto. O romance
entre Baby e Debora, por exemplo, é retratado de uma forma idealizada e
simplista, remetendo a outros casais clássicos da história do cinema (incluindo
uma menção à Bonnie e Clyde) e incluindo até mesmo cenas em preto e branco, enquanto
o personagem Bats, vivido por Jamie Foxx, parece uma caricatura do criminoso
imprevisível e meio alucinado tão comum em filmes do gênero. Não há uma
preocupação em desenvolver uma história complexa e profunda aqui, o filme se
assume como uma brincadeira com gêneros e convenções cinematográficas e acaba
soando mais como um exercício de estilo do que como uma obra narrativa
sofisticada, e não há nada de errado nisso.
Mesmo com este enredo
convencional, os atores conseguem fazer um excelente trabalho em cativar o
público. Elgort é eficiente em abraçar o estereotipo do herói estoico com um
passado trágico, mas que esconde um coração bondoso; Kevin Spacey, Jamie Foxx,
Eiza Gonzáles e Jon Hamm criam uma gangue de bandidos extremamente carismáticos
que passeiam entre o charmoso e o ameaçador com uma fluidez magnética e Lily
James mesmo com pouco material para desenvolver a personagem consegue passar
genuinidade para Debora e estabelece uma química real com o protagonista.
O elenco é carismático e cativa mesmo com personagens superficiais |
A verdadeira estrela do filme,
porém, encontra-se atrás das câmeras, pois como eu disse antes, este não é um
filme de enredo nem um filme de atuações, é um filme de estilo. A assinatura de
Edgar Wright está estampada por toda a obra: cortes rítmicos e dinâmicos,
planos detalhes criativos, enquadramentos inusitados que geram piadas, planos
sequência que brincam com a interação dos personagens com o cenário, zooms
super expressivos, movimentos abruptos de câmera e assim por diante. É um
diretor que não tem medo de usar todas as técnicas cinematográficas que domina
e brincar com as possibilidades que esta forma de arte proporciona. Há
excelentes cenas de ação extremamente bem dirigidas, assim como cenas mais
silenciosas e mundanas de interação entre os personagens que também recebem um
tratamento original e caprichado (uma cena em uma lavanderia merece ser
mencionada pelo maravilhoso uso de cores e do cenário). Não há nada de
enfadonho ou preguiçoso na direção e é animador ver um diretor tão jovem
entregando trabalhos cada vez mais empolgantes em um momento onde o cinema
blockbuster de entretenimento anda tão carente de vozes autorais.
Em Ritmo de Fuga é um filme que
traz mais camadas para quem é amante de cinema, as várias referências a filmes
antigos, o enredo clássico e a direção marcante serão mais bem apreciados por
quem tem mais contato com a sétima arte, porém, para além disto, é um
divertidíssimo filme de ação e comédia que se sustenta sozinho e tem tudo para
cativar o grande público com seu ritmo envolvente, seus personagens
carismáticos e sua trilha sonora maravilhosa.
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