O Telefone Preto é o primeiro filme de Scott Derrickson que eu posso dizer que gostei, com poucos poréns. E Jason Blum, que ele continue dando luz verde para esses tipos de filmes.
Derrickson monta um cenário sinistro, realisticamente ordinário, num claro aceno a Halloween (1978), é um retorno inequívoco a ênfase do gênero de terror ao Stranger Danger. No caso de Black Phone, revisita a ideia de que todos os estranhos podem ser potencialmente perigosos. Um exemplo de pânico moral, embasado ou não, que encapsula o perigo que as crianças iminentemente associam a adultos que não conhecem.
Derrickson continua num estilo que mistura dramas de crime procedurais de polícia/detetives com terror supernatural. Mas ainda não tem um filme na sua filmografia que seja noir o suficiente pra me cativar por completo. Nesse filme Derrickson não traz apenas um ferramental que já observamos no catálogo dele (Sinister [2012], Devil's Knot [2013], Livrai-nos do Mal [2014]), traz sequencias com estruturas tiradas direto de O Silêncio dos Inocentes (1991), em específico os últimos 20 minutos do filme.
A Little Miss Badass Madeleine McGraw é a grande estrela desse flick, tem muito mérito por fazer a melhor atuação do filme e realmente me fazer torcer por ela. Esse aspecto é imprescindível para o filme funcionar. Ele funciona.
Esteticamente o vilão não merece tanto louvor, a maior parte dos adereços são reprisados ou derivações diretas de Stephen King. O que eleva a performance de fato é Ethan Hawke que, independentemente do gênero de filme que ele esteja atuando, constantemente entrega um trabalho excepcional.
Quanto a trilha, quando ela trabalha com um drone constante até a metade do filme é bacana, mas na introdução de um som com textura mais eletrônica, no último quarto do filme, faltou encaixe.
A história de Joe Hill, na qual o filme é baseado, é também nutrida pela veia de Stephen King. Essa adaptação prende-se a essa raiz e intrepidamente apresenta certos tabus, sem medo de incluir crianças sob ameaça, ou sofrendo violência explicita.
Finalmente, o miolo do filme distingue-se por um principal motivo: a máxima lovecraftiana de que o NADA é mais assustador. Só vislumbres (como o shape em Halloween [1978]) do sequestrador, ou de sua van caricata, é o bastante. Pode ser qualquer cara suburbano comum. Por boa parte do filme, nada é explicado sobre as reais intenções do vilão, e quando recebemos dicas de quais elas podem ser, remetem ao tema de violência doméstica já estabelecida na dinâmica familiar de Finney (Mason Thames). Possivelmente, aqui vemos a ideia, dadas as respectivas peculiaridades, de uma reprodução de Norman Bates, dessa vez com uma incorporação do pai, ao invés da mãe. Indicando um círculo vicioso de violência no qual o personagem de Ethan Hawke está inserido, mas o filme não tenta humaniza-lo diretamente.
Pode-se dar uma conotação supernatural ao sequestrador na forma de um coletor de almas que, possivelmente, coloca suas vítimas num purgatório na figura do telefone. Mas tudo isso está no reino da especulação sem embasamento. Igualmente, não podemos ter certeza se Gwen está realmente falando com Jesus ou é uma de forma de deus exterior intergaláctico à la Stephen King e It misturado com Lovecraft.
Dito isso, honestamente, as cenas mais aterrorizantes são as em que a violência doméstica é ameaçada ou explícita.
Por mais que recomende O Telefone
Preto, o que falta é um trabalho mais original do Dickerson. Inegavelmente, ele
é muito talentoso e extremamente bem estabelecido, sabe que tipo de filme gosta
de fazer. Contudo, sinto necessidade de um neck snap mais visceral e pessoal
nas suas películas, como Robert Eggers e Ari Aster tem feito.
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