#SessãoDaMeiaNoite: Sexo Apressado come Cru


NINFOMANÍACA
Diretor: Lars Von Trier
Elenco: Stellan Skarasgaard / Charlotte Gainsbourg / Shia La Beouf
 Estreou em 2014
dois volumes

Proibido para menores de 18 anos


Brandon e Joe dão-se as mãos e são sexadictos.  
Há quem diga, também, que no filme Ninfomaníaca, a jovem disponibiliza o seu corpo à esquerda e à direita – sem qualquer conotação política -  levando a coisa às últimas consequências. Seria o orgasmo?
Lars Von Trier é o diretor. Ele mesmo já se pronunciou como o ‘melhor diretor do mundo’, fundador do inesquecível Dogma 95.

NINFO parece mostrar o sexo pelo lado da doença, mas, podemos afirmar que a menina ‘doente’, entre aspas mesmo,  transa e os outros são saudáveis? Ou, serão todos saudáveis, uns querendo mais, e, outros, querendo menos. Millôr Fernandes disse que a maior perversão sexual é a abstinência.  

Von Trier, só para dar umas dicas da técnica usada, gosta de cortes bruscos;  incorpora na obra as imperfeições da filmagem: movimentos rápidos, desfocalizações, granulaturas, câmera na mão, por exemplo, que era uma das diretrizes do movimento Dogma 95.  Dizia que era para ficar de igual a igual com os atores.
Mas, voltando...
A jovem Joe pratica sexo compulsivamente. E daí? Será distúrbio? Como reconhecer o que é o ‘normal’ entre quatro paredes?
A mídia é mestra e propaga e afirma por tabelas e dados sobre aquilo que é o considerado ‘normal’ já que a trata divulga para todos, para medíocres, para a média. A pessoa que não cabe nessa classificação - que não cabe no conceito de normalidade -  se sente mal e isso vira doença imposta. O mesmo se dá com gordinhos. A mídia os quer magros e eles se sentem mal e incomodados com a situação. E farão suas dietas que nada resolvem. Ou cirurgias.
A vida da pessoa pode ser calcada no sexo e na sede: desejar mais de um copo d’água... querer beber mais e muito mais e beber em copos diferentes. Se esta pessoa estiver presa a liames burocráticos terá problemas na beberagem da água. Será possível usar outros copos?

Há exemplos do que chamam negativo, mas, vejo  que os moralistas de plantão apontam o dedo  obedecendo alguma cartilha religiosa.  Joe passa a fazer sexo com vários parceiros diariamente, mesmo contrariando sua consciência e isso é a imposição da sociedade: “eu dizia sim querendo dizer não”. Sartre propõe o contrário: sempre há escolha e você sempre escolherá. Se seu corpo diz sim é sim. Você diz sim querendo dizer sim.
Homens que praticam sexo compulsivamente são pegadores, galinhas. Mulheres serão doentes? O homem é um sátiro.

Moralizam tudo. Diz o cientista do hospital: se isso atrapalha o funcionamento e produção da vida social ou familiar da pessoa, ela está doente. Notem que tudo tema  ver com produção. Outros dirão que sexo é anestesia.
Qual será o comportamento correto? Onde está a tabela?

Será bom levar em consideração que Trier é um provocador – dizendo-se pró Hitler, sem ser alemão,  está clara sua posição de provocador, além de ter em seu currículo ser banido do Festival de Cannes -  e muita vez ele provoca para ver onde vai dar a elasticidade da paciência da plateia.

Em filme recente do Di Caprio praticar sexo com muitas mulheres só seria problema se o camarada não pagar as contas. E tiver potência suficiente para isso. Ou muita pílula azul. No entanto, segundo a dupla moral vigente, mulheres que fazem o mesmo, não roubam ninguém, nem tiram proveito financeiro disso, são consideradas doentes, necessitam de médicos, mas são incuráveis. Esta é a moral patriarcal.

Joe, apesar dos problemas, se levanta e se entende que não é a primeira vez que aquilo tudo acontece. Ela encara o destino, mas, não me parece que ela aceite como fado ser a culpada por tudo de mal que lhe acontece. Não. Ela aceita que aquele formato sempre acontecerá e ela sempre se levantará. Vejo positividade na atitude, afinal ela é a única que sabe de seus problemas.
As conversas com Seligman que, salvo outra hipótese, é um ‘zelig’, portanto um camaleão que mudará de conduta ou de cor, parece ato confessional.

Um pôster de divulgação mostra o Jerome enfiando a boca em local adequado enquanto Joe lê. Ela nem está aí? Tanto faz? Por que sofreria então? Por que não deu tempo de ler o capítulo?
Lars Von Trier trata dessa situação de forma prosaica, numa narrativa leve, mostrando que é tão solene quanto beber o tal copo d’água. A Joe jovem até parece, um pouco,  as japonesinhas sexualizadas dos mangás, com cara de ninfeta proibida se dando à sanha dos velhotes, enquanto abre o vestidinho plissado de alunas do Sacre Coeur.

As mulheres de Trier nada querem com o papel que a sociedade espera da feminina rainha do lar. A rainha do lar foi para o espaço. Vide She, Justine e muitas outras mulheres de sua época do Dogma 95, quando trabalhava ao lado de Thomas Vinterberg.  O casamento como armadilha para quem ama a liberdade. Amor e casamento burgueses são como prisões.
Joe começa bem, comandando a jornada. Masturbação coletiva, quem transa mais em menos tempo, sedução de velhos e experientes.  E Lars rompe com a narrativa para o cliente que for para assistir a um filme pornô. Ele usa densas imagens, mas, estas estão no contexto que se espera.
De outra forma, caso frustre a todos, a plateia masturbatória pode ver os pedaços que lhe interessar acessando a net.

Mas, há frustrações para nossa anti-heroína Joe. No amor.
Ela se apaixona pelo seu deflorador. Ah! Flores!
Se essa possibilidade de amor normal não dá certo – de atos puros e santos – ela vai ao extremo para compensar. Se não há como obter uma relação responsável, o caminho é a perversão, e, leitora e leitor, no campo da perversão fica a tua cabeça por conta de criar, seja lá o que for, para sua própria satisfação.
Não serei eu o culpado.

Em tempo: não sabendo o que dogma 95 é,  cinéfilo, o leitor não é.

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2 comentários:

  1. Interessante a crítica. Realmente a questão feminina é complicada para a sociedade: uma prostituta não é bem aceita, mas espera-se que tenha múltiplos parceiros (as). "Pagando bem que mal tem". Mas uma mulher que resolve dar para o mundo por puro prazer e diversão é considerada maluca. Concordo plenamente que o mundinho patriarcal e capitalista precisa ser revisto. Essas observações me fizeram ter vontade de ver o filme. Sem contar que gostei muito da comparação com gordinhos (será que me identifiquei?).

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  2. Me sinto culpado só de ler. Hahaha

    Este filme está na minha lista de próximos a assistir. Uma pena que eu esteja afastado do cinema

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